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ConflitosCoreia do Norte

Espaço sideral vira campo de batalha entre as duas Coreias

Julian Ryall
26 de janeiro de 2024

Pyongyang e Seul lançaram seus primeiros satélites espiões e anunciaram mais investimentos no setor. Dois modelos distintos, que dão prestígio ao Norte e perspectiva de lucro ao Sul.

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Foguete Falcon 9 da SpaceX decolando
Coreia do Sul lançou em dezembro seu primeiro satélite de vigilância, a bordo de um foguete Falcon 9 da SpaceXFoto: SpaceX/AFP

A rivalidade militar entre as duas Coreias está se intensificando, e tanto Seul como Pyongyang vêm apostando no espaço sideral para estar melhor preparadas para um eventual conflito e impulsionar o desenvolvimento de tecnologias avançadas.

Em meados de novembro, Kim Jong-un anunciou que seu país havia entrado em uma "nova era de poder espacial" após o lançamento bem-sucedido do Malligyong-1, o primeiro satélite espião desenvolvido internamente pela Coreia do Norte.

Poucas horas após o lançamento, e desafiando resoluções das Nações Unidas contra o desenvolvimento de mísseis e foguetes pela Coreia do Norte, Kim afirmou ter visto fotografias tiradas pelo novo satélite que mostravam bases militares americanas no Japão e na Coreia do Sul. Ele não divulgou nenhuma imagem, o que torna impossível determinar a capacidade do seu sistema óptico.

Para não ficar para trás, a Coreia do Sul lançou em dezembro seu primeiro satélite espião, colocado em órbita a bordo de um foguete Falcon 9 operado pela SpaceX, uma empresa aeroespacial privada dos EUA. Seul também está desenvolvendo seus próprios veículos de lançamento e anunciou planos ambiciosos para colocar satélites em órbita e até mesmo contribuir para a exploração da Lua.

Em 11 de janeiro, o Ministério da Ciência em Seul anunciou que criaria uma agência espacial em maio e que pretendia conquistar 10% do mercado global de voos espaciais até 2045. A criação da Korea AeroSpace Administration (KASA) foi uma das promessas de campanha do presidente Yoon Suk-yeol, motivada pela esperança de que o setor se torne um componente importante da economia do país.

Pyongyang lançou míssil balístico

Três dias após o feito aeroespacial da Coreia do Sul, a Coreia do Norte lançou um míssil balístico de alcance intermediário movido a combustível sólido, empregando muitas das tecnologias que também são usadas em foguetes projetados para colocar satélites em órbita.

Em um discurso à nação em dezembro, Kim disse que pretende lançar pelo menos mais três satélites espiões neste ano para aprimorar sua capacidade militar. Especialistas acreditam que engenheiros aeroespaciais do país estão se beneficiando de tecnologia e know-how russos compartilhados em troca de projéteis de artilharia norte-coreanos para a guerra na Ucrânia.

"O Serviço Nacional de Inteligência da Coreia do Sul acredita que a Rússia ajudou a Coreia do Norte no lançamento e na entrada em órbita de seus satélites militares", disse à DW Hyobin Lee, professora especializado em política tecnológica da Universidade Nacional de Chungnam.

Sala de comando com monitores mostrando lançamento de foguete
Em novembro, Coreia do Norte lançou seu satélite de vigilância Malligyong-1Foto: YONHAPNEWS AGENCY/picture alliance

A cooperação em atividades relacionadas ao espaço foi destacada quando Kim viajou para se encontrar com o presidente russo Vladimir Putin no Cosmódromo Vostochny, na região russa de Amur, em setembro.

"A competição em tecnologia espacial se intensificará no futuro", disse Lee à DW. "A Coreia do Norte provavelmente continuará a desenvolver e lançar mais satélites para incrementar suas ameaças nucleares, enquanto a Coreia do Sul fará o mesmo para fortalecer suas capacidades de dissuasão."

Embora as agências de inteligência da Coreia do Sul tenham minimizado a capacidade dos satélites da Coreia do Norte de coletar informações, Lee disse que é provável que os cientistas de Pyongyang continuem aprimorando suas capacidades, e Seul precisa estar pronta para fazer frente a isso.

Seul planeja ter 130 satélites

Esse processo já está em andamento, e Seul planeja ter até 130 satélites em órbita terrestre baixa até o início da próxima década como parte de uma rede de vigilância e comunicação militar. Esse sistema é um componente essencial da capacidade de reação do país, que tem como um dos objetivos atingir os líderes norte-coreanos no caso de um ataque ao Sul.

Em contraste com a política espacial do Norte, que se concentra estritamente em aplicações militares, o Sul também procura lucrar com o espaço, afirma Dan Pinkston, professor de relações internacionais no campus de Seul da Universidade de Troy.

"São dois modelos muito diferentes de desenvolvimento. O do Norte é liderado pelo Estado e planejado centralmente, e o do Sul busca parcerias internacionais e projetos público-privados para lançar satélites e, em última instância, explorar o espaço", explica.

Kim Jong-un andando ao lado de Vladimir Putin
Especialistas avaliam que regime de Kim Jong-un está recebendo auxílio tecnológico russo em troca de projéteis de artilharia para a guerra na UcrâniaFoto: Shamil Zhumatov/Pool Photo/AP Photo/picture alliance

Os programas espaciais do Norte são prejudicados por escassez de financiamento, falta de acesso às tecnologias mais recentes e recusa da maioria das outras nações que se dedicam à exploração espacial em cooperar com Pyongyang, afirma Pinkston. No entanto, ele pontua que há evidências de que o Norte está recebendo assistência da Rússia e que seus hackers provavelmente têm conseguido algum acesso à tecnologia espacial de outros países.

E embora as informações fornecidas pelos satélites de espionagem e comunicação sejam fundamentais para a Coreia do Norte coordenar qualquer ataque contra outro país, o preço do desenvolvimento e do lançamento desses equipamentos terá um impacto severo em outras áreas da economia nacional.

"O custo desses sistemas é muito alto para a Coreia do Norte, considerando o tamanho de sua economia em geral, e os recursos que eles investem em satélites e no espaço não podem ser gastos em outro lugar."

Reação no espaço

Pinkston fala em uma "inevitável" reação no espaço. "Os adversários do Norte têm mais capacidade de responder e reagir por meio de armas antissatélite que podem bloqueá-los ou até destruí-los, e tenho certeza de que os EUA e a Coreia do Sul têm trabalhado em capacidades de contenção capazes de desativar um satélite norte-coreano, temporária ou permanentemente, caso seja necessário."

Dada as vulnerabilidades do programa espacial do Norte, a professora Lee avalia que um dos benefícios mais significativos pode ser o valor da propaganda para seu público interno e do uso da imagem de uma nação tecnologicamente desenvolvida.

"O lançamento de satélites de reconhecimento pela Coreia do Norte certamente pode ser visto como um símbolo de seu status de nação avançada", disse ela, acrescentando que o Norte superou o Sul ao conseguir lançar seus próprios veículos recentemente, enquanto seu rival dependeu de uma empresa privada dos EUA.

"Mesmo que não tenha superado a Coreia do Sul em outras áreas industriais, a liderança no setor espacial é, sem dúvida, um ponto de orgulho para a Coreia do Norte", disse. "Portanto, esses avanços podem ser um instrumento importante para a Coreia do Norte fortalecer sua posição e influência no cenário internacional."