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O mês mais mortal da pandemia no Brasil

1 de abril de 2021

Em março, país registrou mais de 66 mil mortes por covid-19, mais que o dobro do contabilizado em julho de 2020, pior mês até então. Terceiro mês de 2021 foi marcado ainda por colapso de hospitais e queda de ministros.

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Cruzes em túmulos de mortos por covid-19 em cemitério do Rio de Janeiro
Cruzes em túmulos de mortos por covid-19 em cemitério do Rio de JaneiroFoto: Buda Mendes/Getty Images

Em meio a recordes diários de óbitos, o Brasil fechou o mês de março como o mais mortal da pandemia de covid-19, registrando mais de 66 mil mortes apenas nos últimos 31 dias. O número é maior do que a população de 5.067 dos 5.570 municípios do país.

O total de óbitos registrados em março é mais do que o dobro do contabilizado em julho do ano passado (mais de 32 mil mortes), que até o momento era o mês mais mortal da pandemia no país.

Nesta quarta-feira (31/03), o Brasil registrou o segundo dia consecutivo de recorde de mortes por covid-19. Em apenas 24 horas, foram contabilizadas 3.869 mortes associadas à doença, segundo dados divulgados pelo Conselho Nacional de Secretários da Saúde (Conass).

Também foram identificados 90.638 novos casos da doença. Com isso, o total oficial de infecções no país subiu para 12.748.747, enquanto os óbitos chegam a 321.515.

A média móvel de mortes dos últimos sete dias também registra aumento contínuo. Na quarta-feira, ela chegou a 2.971 por dia, a pior taxa pelo sexto dia consecutivo, segundo dados do consórcio de imprensa. Pela primeira vez, mais de 20 mil óbitos pela doença ocorreram em apenas uma semana. Há 15 dias, a média está acima de 2 mil mortes por dia.

Em 24 de março, o Brasil superou a marca de 300 mil mortes. A trágica marca foi mais uma indicação da aceleração da pandemia no país. Ela foi alcançada apenas 75 dias após o registro dos 200 mil óbitos. Em comparação, o país levou 148 dias para registrar 100 mil mortos e depois mais 152 dias para chegar aos 200 mil mortos.

Transmissão avança pelo país

O Brasil enfrenta o pior momento da pandemia. Além da aumento no número de mortes, há uma explosão na transmissão do coronavírus no país. A média móvel de casos dos últimos sete dias está em 75.154 por dia.

Especialistas já previam que o mês de março seria trágico. Em entrevista à DW, a pesquisadora Margareth Dalcolmo, da Fundação Oswaldo Cruz, afirmou que o Brasil enfrentava taxas de transmissão muito altas e curvas de mortalidade em ascensão e pediu que a sociedade se conscientizassem da necessidade do isolamento social e medidas sanitárias.

O avanço descontrolado da pandemia no país se tornou terreno fértil para mutações do coronavírus. A variante P1, originária de Manaus, acabou se espalhando por vários estados. Na cidade de São Paulo, ela já é responsável por 64% dos casos, e no Rio de Janeiro por 84%.

Segundo o virologista alemão Christian Drosten, com a movimentação livre da população e sem medidas de intervenção, como o uso obrigatório de máscara, a variante encontrou as "portas abertas" para uma segunda onda rasante.

"Porque a política não toma medidas de prevenção ou porque as estruturas do país são tais que não é possível tomá-las devido à pobreza, então, ocorrem tais fenômenos como uma segunda onda da pandemia tão terrível como a que estamos vivendo no Brasil neste momento", afirmou Drosten na terça-feira, em seu podcast Coronavirus Update na rádio Norddeutscher Rundfunk.

A explosão no número de infecções levou ainda ao maior colapso sanitário e hospitalar da história do país. Em diversos estados, as UTIs ficaram lotadas, não somente no sistema público, e pacientes morreram em filas de espera por um leito.

Pronunciamento e troca de ministro

Com a piora da situação no país, a pressão do Congresso e o fracasso na aquisição de vacinas, a permanência de Eduardo Pazuello no comando do Ministério da Saúde se tornou insustentável. Em 15 de março, o presidente Jair Bolsonaro anunciou o médico Marcelo Queiroga como novo ministro da Saúde, o quarto a ocupar a pasta durante a pandemia.

Nos dez meses à frente da pasta – quatro como interino, seis como efetivado –, Pazuello, um general da ativa, acabou se destacando mesmo por obedecer ordens sem apresentar questionamentos – incluindo ordens que contrariavam o consenso científico e boas práticas de gestão.

O caos da saúde levou ainda Bolsonaro, que desde do início da pandemia se opunha a medidas de isolamento e ao uso de máscaras, a se pronunciar em cadeia nacional. No mesmo dia em que o país registrou mais de 3 mil mortes por covid-19 em 24 horas pela primeira vez, em 23 de março, o presidente tentou defender as ações do governo no combate à crise, mas mentiu e distorceu dados sobre a vacinação.

Na fala de pouco mais de três minutos, apesar de reconhecer que o coronavírus "infelizmente tem tirado a vida de muitos brasileiros", o presidente sequer mencionou o recorde de mortes. Ele afirmou que o governo tomou medidas para combater o coronavírus ao longo de toda a pandemia e que sempre foi a favor das vacinas.

Na realidade, ao longo de um ano de pandemia, apesar de lançar medidas econômicas, Bolsonaro minimizou frequentemente os riscos do coronavírus, combateu medidas de isolamento social, promoveu curas sem eficácia, criticou a vacina e tentou sabotar iniciativas paralelas de vacinação e combate à doença lançadas por governadores e prefeitos em resposta à inércia do seu governo na área.

Queda também no Itamaraty

A situação da pandemia também custou a Ernesto Araújo o cargo. O extremista acabou pedindo demissão na segunda-feira, após ter sido duramente criticado por parlamentares numa audiência no Senado sobre a atuação do Ministério das Relações Exteriores para obter vacinas contra a covid-19 no exterior na semana passada.

Por questões ideológicas, o ministro teria se oposto à entrada do Brasil no consórcio global liderado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) Covax Facility, que prevê o envio de 42 milhões de doses de imunizantes para o país. Os senadores defenderam a demissão de Araújo.

Além de toda pressão externa, a situação de Araújo era insustentável dentro do próprio Itamaraty. No sábado, um grupo de cerca de 300 diplomatas divulgou uma carta na qual criticavam a postura adotada pelo ministro e deram a entender que desejavam que o chanceler deixasse o cargo. A situação teria se agravado com a condução da política externa no contexto da pandemia.

"A crise da covid-19 tem revelado que equívocos na condução da política externa trazem prejuízos concretos à população. Além de problemas mais imediatos, como a falta de vacinas, de insumos ou a proibição da entrada de brasileiros em outros países, acumulam-se danos de longo prazo na credibilidade internacional do país", destaca o documento.

cn/lf (ots)