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Como Bolsonaro turbinou o uso da máquina pública na eleição

26 de outubro de 2022

Entre 1º e 2º turnos, o governo incluiu milhares de famílias no Auxílio Brasil e no auxílio gás, liberou empréstimo consignado para beneficiários do programa e criou financiamento com FGTS futuro, entre outras medidas.

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Jair Bolsonaro olhando para a frente
Custo das medidas de elevação de despesas e redução de receitas por Bolsonaro desde o fim de 2021 chega a cerca de R$ 400 bilhõesFoto: Adriano Machado/REUTERS

Visando ampliar sua chance de reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) vem ao longo do ano abrindo os cofres públicos para criar e ampliar uma série de programas sociais que beneficiam as famílias mais pobres e categorias que integram sua base de apoiadores, como taxistas e caminhoneiros.

O carro-chefe foi a aprovação de uma emenda à Constituição em julho, apelidada "Kamikaze", que decretou o estado de emergência no país para autorizar a criação de novos benefícios em ano eleitoral, pagos à margem do teto de gastos.

Na esteira, o governo aumentou o valor do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600, e do auxílio gás de R$ 50 para R$ 110, e criou um auxílio mensal de R$ 1.000 para taxistas e caminhoneiros, entre outras medidas.

A gestão Bolsonaro também já havia zerado a alíquota de tributos federais e limitado a alíquota do ICMS, um imposto estadual, cobrado sobre os combustíveis, o que levou à redução do preço do diesel, da gasolina e do gás, com efeito na redução da inflação.

O uso da máquina pública para a criação de novos benefícios diretos e indiretos seguiu após a realização do primeiro turno, em 2 de outubro, quando Bolsonaro recebeu 43,2% dos votos válidos, ficando atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que teve 48,4%.

A agência Reuters calcula que os benefícios criados e prometidos por Bolsonaro nos últimos meses somam R$ 273 bilhões, com impacto tanto em 2022 como em 2023. Outra conta, apresentada pelo economista Bernard Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, aponta que o custo anualizado das medidas de elevação de despesas e redução de receitas tomadas desde o fim de 2021 chega a cerca de R$ 400 bilhões, ou 4% do PIB (Produto Interno Bruto).

As medidas anunciadas pelo governo neste ano não foram alvo de questionamento da Procuradoria-Geral Eleitoral por possível abuso de poder político e econômico. O órgão é chefiado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, considerado pela oposição um aliado do presidente.

Confira as medidas anunciadas pelo governo após o primeiro turno:

Antecipação do pagamento do Auxílio Brasil e do auxílio gás

Em 3 de outubro, o governo anunciou que o pagamento do Auxílio Brasil e do auxílio gás do mês de outubro seria feito entre os dias 11 e 25, sete dias antes do que no calendário original, que ia de 18 a 31 de outubro. A antecipação do calendário não vale para os meses seguintes.

Cerca de 21,1 milhões de famílias recebem o Auxílio Brasil de R$ 600, e 5,9 milhões são beneficiárias do auxílio gás, pago a cada dois meses no valor de R$ 112.

Inclusão de mais famílias no Auxílio Brasil e no auxílio gás

Em 4 de outubro, o governo anunciou a inclusão de mais 500 mil famílias no Auxílio Brasil já neste mês. Comparado a julho, quando 18,1 milhões de famílias recebiam o benefício, a alta foi de 16,5% no total de famílias atendidas pelo programa.

No mesmo dia, o governo anunciou também a inclusão de mais 200 mil famílias no auxílio gás, elevando o número de famílias beneficiadas de 5,7 milhões para 5,9 milhões no programa.

Promessa de 13º do Auxílio Brasil

Também em 4 de outubro, Bolsonaro prometeu que, se reeleito, pagará uma 13ª parcela do Auxílio Brasil para mulheres chefes de família a partir de 2023, o que beneficiaria 17 milhões de mulheres, a um custo de quase R$ 10 bilhões.

O presidente não especificou qual seria a fonte dos recursos para esse benefício adicional.

Refinanciamento de dívidas

Em 6 de outubro, Bolsonaro anunciou que a Caixa lançaria um programa de renegociação de dívidas de empresas e pessoas físicas. Trata-se da reciclagem de um programa já existente, chamado Você no Azul, que ocorre anualmente desde 2019.

O presidente disse que o programa poderia beneficiar até 4 milhões de cidadãos e 400 mil empresas com dívidas com a Caixa. A iniciativa permite a quitação de dívidas com atraso acima de 360 dias, com descontos de 40% a 90% do valor devido.

Antecipação do auxílio para taxistas e caminhoneiros

Em 7 de outubro, o governo anunciou que pagará uma parcela extra do auxílio taxista no fim do ano, como se fosse um décimo terceiro salário, mas em valor ainda não definido. A justificativa foi de que menos profissionais se cadastraram do que o previsto, e a sobra dos recursos seria utilizada no mesmo programa.

A data do pagamento do auxílio taxista e do auxílio caminhoneiro em outubro também foi adiantada, do dia 22 para 18. As parcelas são de R$ 1.000 mensais, com o objetivo de compensar a alta dos combustíveis.

Início do consignado do Auxílio Brasil

A presidente da Caixa, Daniella Marques, anunciou em 4 de outubro que o banco começaria a oferecer empréstimos na modalidade "consignado" para os beneficiários do Auxílio Brasil e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), com juros de 3,45%, abaixo do teto de 3,5% estabelecido pelo governo. Os empréstimos começaram a ser liberados em 11 de outubro.

O valor máximo da parcela a ser descontada para o pagamento do empréstimo é de 40% do benefício, ou R$ 160 – o valor-base é do Auxílio Brasil é de R$ 400. A juros de 3,5%, o valor máximo do empréstimo é de R$ 2.569,34, pagos em 24 vezes.

Nesta segunda-feira, o ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União (TCU), recomendou a suspensão temporária do empréstimo consignado do Auxílio Brasil, até que o órgão analisasse o possível uso da iniciativa para "interferir politicamente nas eleições presidenciais". Nesta terça-feira, a Caixa anunciou a suspensão da concessão de novos empréstimos nessa modalidade por 24 horas, atendendo à recomendação.

Especialistas em políticas sociais criticaram a possibilidade de obter empréstimos consignados com base no Auxílio Brasil, pois as parcelas comprometeriam os recursos dessas famílias mais pobres para garantir sua sobrevivência nos meses seguintes.

Mais prazo para atualizar dados no Cadastro Único

Em 13 de outubro, o governou prorrogou por 30 dias o prazo para que famílias atendidas por benefícios sociais atualizassem seus dados no Cadastro Único, medida necessária para evitar a suspensão ou cancelamento do recebimento dos programas.

Mais de 1,4 milhão de famílias haviam sido convocadas para atualizar seu cadastro até 14 de outubro, dos quais 757 mil são beneficiárias do Auxílio Brasil. Muitas delas estavam enfrentando filas nos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) ou postos de atendimento dos municípios, que realizam esse cadastro.

Via de regra, as famílias devem atualizar os dados a cada dois anos, ou quando houver alterações.

Financiamento imobiliário com FGTS futuro

Em 18 de outubro, Conselho Curador do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) aprovou o uso de recursos futuros do FGTS para a garantia de financiamentos imobiliários, atendendo a uma sugestão do Ministério do Desenvolvimento Regional.

A iniciativa valerá inicialmente para famílias com renda bruta de até R$ 2.400, e permitirá que financiem imóveis com valor acima do seu limite de endividamento atual.

Nessa modalidade, parcelas futuras depositadas no FGTS do tomador do empréstimo serão automaticamente reservadas para pagar o financiamento. Se o empregado for demitido, porém, ele não poderá sacar o saldo já comprometido.

Essa medida tem potencial para ampliar o acesso à compra de imóveis por meio do Programa Casa Verde Amarela, criado no governo Bolsonaro.