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Governo destina publicidade a canais de conteúdo inadequado

3 de junho de 2020

Relatório da CPMI das Fake News aponta que governo veiculou propaganda em sites que promovem jogo do bicho, fanpages do presidente, páginas bolsonaristas que propagam notícias falsas e até um canal do YouTube em russo.

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Jair Bolsonaro
Relatório analisou dados sobre publicidade feita entre 6 de junho e 13 de julho do ano passadoFoto: Getty Images/A. Anholete

Em apenas 38 dias, o governo de Jair Bolsonaro publicou mais de 2 milhões de anúncios em canais na internet com "conteúdos inadequados", segundo mostrou um relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News divulgado nesta quarta-feira (03/06) pelo jornal O Globo. Verba pública foi usada para veicular propaganda em sites que divulgam notícias falsas, que publicam pornografia e promovem jogos de azar proibidos ou investimentos ilegais.

O relatório tem como base dados fornecidos pela Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), que repassou apenas informações sobre publicidade feita entre 6 de junho e 13 de julho do ano passado, apesar de o pedido ser referente aos dez primeiros meses de 2019. Mesmo sem o período completo, o relatório mostra que o governo publicou 2.065.479 anúncios em 843 canais considerados inadequados, ou seja, 4,37% do volume total veiculado neste período.

O relatório afirma que entre os canais estão 47 que divulgam notícias falas, 741 que foram removidos do YouTube por descumprir o regulamento da rede social, 12 que publicam informações sobre jogos de azar e quatro que promovem a pornografia. Entre os propagadores de fake news que receberam anúncios do governo citados no documento estão os sites bolsonaristas Jornal da Cidade Online, Folha do Brasil, Terça Livre – do blogueiro investigado pela Polícia Federal (PF) Allan dos Santos –  e até páginas alinhadas com o PT como Diário do Centro do Mundo e Revista Fórum.

Somente Allan dos Santos, que negou em novembro à CPMI receber dinheiro público, teve seu canal no YouTube beneficiado por 1.447 anúncios do governo federal no período analisado. O blogueiro, por exemplo, já publicou informações falsas sobre jornalistas que fizeram reportagens investigativas sobre o governo Bolsonaro. Seu site também é um repositório permanente de difusão de teorias conspiratórias sobre temas como a pandemia de coronavírus.

No topo dos sites que mais receberam dinheiro público para divulgar publicidade do governo está a página "Resultados Jogo do Bicho". Segundo o jornal O Estado de S.Paulo, o site conta com 319.082 impressões – a quantidade de vezes que o anúncio foi exibido aos usuários da página. O jogo do bicho é proibido no Brasil.

Já um dos sites que recebeu mais de 66 mil impressões publica conteúdos como "múmias alienígenas escondidas em pirâmides do Egito, colisores de átomos que abrem portais para o inferno e baleias encontradas em fazendas a centenas de quilômetros do litoral". Outro em russo recebeu mais de 101 mil anúncios pagos com recursos federais.

O governo direcionou propaganda até mesmo para fanpages do presidente Jair Bolsonaro, como o canal de YouTube "Bolsonaro TV"  e aplicativos para celular “Brazilian Trump”, “Top Bolsonaro Wallpapers” e “Presidente Jair Bolsonaro”, segundo o Estadão.

A CPMI ainda apontou que dos 20 canais no YouTube que mais veicularam anúncios da campanha Nova Previdência no ano passado, 14 são tem como alvo o público infanto-juvenil. Um deles tem até seu conteúdo todo em russo, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo.

Esses anúncios são veiculados por meio do programa Google Adsense, que administra e destina anúncios publicitários a sites cadastrados, cujo pagamento é baseado na quantidade de cliques e visualizações.

O relatório afirmou que o uso da ferramenta pela Secom gerou "incorreções na condução da política de publicidade oficial", incluindo veiculação de anúncios em canais inadequados, falta de transparência e desperdício de dinheiro público.

Em nota, a Secom afirmou que destina as verbas publicitárias ao Google Adsense e que o programa é o responsável pela distribuição dos anúncios. "Ou seja, cabe à plataforma as explicações pertinentes sobre a ocorrência. Os veículos que constam na lista citada pela matéria foram selecionados pelo desempenho aferido pelo algoritmo do Google, e não pela Secom", ressaltou.

Aberta em agosto de 2019, a CPMI começou investigando a disseminação de notícias falsas na campanha eleitoral de 2018  e se estendeu a atuação do atual governo. Em dezembro, em depoimento, a deputada Joice Hasselmann (PSL-SP), ex-líder do governo no Congresso, denunciou um esquema de propagação de notícias falsas que funcionaria na sede da Presidência. Segundo ela, os mentores da rede são os filhos do presidente Carlos Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro.

CN/ots